Por Igor Gadioli
O entardecer da ilha chega na hora do rush. Uma garoa fina cai do céu fechado. As vias são dos carros, mas isso não impede minha presença na rua, e agora paro minha bicicleta no sinal. Montado na magrelinha em uma brecha apertada de asfalto, me sinto um bicho acuado pelo ronco das máquinas; enquanto o pé espera no chão e o olho espera a luz verde, uma sarjeta profunda aguarda no caminho. Tento pensar rápido, não quero deixar que os motores ao meu redor pensem por mim.
A sarjeta é perigosa e ocupar a rua é um risco - visto da minha engrenagem orgânica, carros em movimento são velozes toneladas de ferro, e nada mais; são ameaças impacientes. O sinal abre e eles agora fluem rasantes ao meu guidom, até que um retrovisor toca meu casaco rapidamente. É como se um segurança de bar encostasse em meu ombro, num desafio velado: você pode conosco?
Não posso com eles. A seguir do toque, vacilo para a direita e esbarro na guia. Pulo para fora do selim com os olhos saltados, agarro a bicicleta com as mãos e, num arranque, estou na calçada. Enquanto assisto a dezenas de carros engolirem minha brecha de rua, monto novamente na bicicleta e já começo a esquecer do susto, imprudência quase necessária para um ciclista na ilha. Calçadas vazias me deixam terminar mais uma viagem a salvo, um dia por vez.
A salvo até quando? De acordo com o Código Nacional de Trânsito, as bicicletas são veículos e têm direito de transitar na malha viária no sentido do fluxo de carros e com 1,5 metro de distância guardada desses carros, independente da existência de ciclofaixas. Mas quem leva isso a sério? Em Florianópolis, motoristas são pouco gentis com ciclistas e pedestres, e a distância de 1,5 metro prova-se uma piada de mau gosto em qualquer pedalada.
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